De que estamos famintos se estamos fartos?
Notícias recentes baseadas em dados da FAO referem que atualmente deitamos fora cerca de um bilião de euros por dia em alimentos desperdiçados, o que significa cerca de um terço dos alimentos não consumidos!
Contudo, ao mesmo tempo, estima-se que existam cerca de 805 milhões de pessoas com fome!
De que estamos fartos? E que fome é esta que nos move e faz querer mais e mais, tanto mais que nos leva a desperdiçar?
Estranho paradoxo este de que tanto se vem falando mas que tanto tarda em ser alterado! Enquanto muitos matam a fome mas não sabem de quê, outros tantos ou mais não têm o que realmente comer!
Dizem-nos as previsões que nos próximos 35 anos a produção alimentar terá de crescer 60%! Pelo enorme aumento de procura de alimentos que tem vindo a verificar-se, pois cerca de 70% da população mundial viverá em contextos urbanos ou próximo deles.
Ao mesmo tempo cresce significativamente a atração dos investidores financeiros por este sector de matérias-primas, o que gera o tremendo risco de o olhar apenas do ponto de vista do lucro que através dele poderão obter!
Nesta competição da produção e da especulação, que sentido faz este pseudocrescimento face ao desequilíbrio que provoca?
Na sua reflexão sobre os “bens comuns” Ricardo Petrella alerta-nos: «Num plano mais geral, "o planeta Terra e a existência do outro" são os primeiros dos bens comuns públicos mundiais. O homem não existiria se não houvesse planeta. Esse, pelo contrário, existiu e existirá ainda sem o género humano. Por outra parte, cada um de nós não existiria se não existisse o outro, o diferente (o homem pela mulher, a mulher pelo homem, o velho e o jovem, o familiar e o estranho, o presente e o passado...)».
Assim sendo, é da nossa responsabilidade o que fazemos (ou não) em prol do mundo em que nos foi dado viver, mas é também essencial o que fazemos ou não em prol daquele outro que dá razão de ser à nossa existência. Neste horizonte como podemos não nos questionar face à forma como próximo de nós utilizamos e partilhamos os recursos que temos, designadamente os alimentos, colocando em causa vida com dignidade a que todos legitimamente aspiramos?
Henrique Joaquim Universidade Católica Portuguesa, presidente da Comunidade Vida e Paz Publicado em 25.03.2015
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