“Doutor dos hereges, mestre dos impudicos, Pai dos mentirosos, Príncipe do mal”, é ele o autor do sofrimento…
O
demônio é o autor responsável de nossos sofrimentos
O homem pecou por instigação do
demônio: era justo que fosse punido; e Deus o puniu
abandonando-o, até certo ponto, ao poder do demônio.
Se não fora alongar-nos, caberia
neste ponto explicar com detalhes como todo o mal que existe no mundo, todas as
desordens perturbadoras da natureza, todas e quaisquer destruições, resultam da
maldita influência deste grande espírito, criado por Deus para ser como que
administrador de todo o mundo material.
Tais desordens e destruições não podem provir de Deus, que é a ordem infinita; tão pouco provém dos anjos, que são ministros de paz, de ordem e de vida; não procedem dos elementos materiais, de si destituídos de poderes e movimento:
Logo vêm desta força
secreta e detestável chamada o demônio, que, posto que não possa
destruí-la, perturba a bela harmonia da natureza.
Assim é que, por mais de
mil maneiras, que os sábios chamam causas secundárias, o autor do mal a
espaços conturba a atmosfera e nela produz os temporais, as tempestades, o
granizo, o raio e quantas assolações os acompanham.
É assim que, para fazer mal ao
homem e às demais criaturas de Deus, ele empeçonha esta e aquela planta, este e
aquele suco, e comunica o seu furor a alguns animais.
É também assim que, com permissão
divina, ele suscita no ar e na água animálculos microscópicos, que difundem
sobre a terra terríveis epidemias, essas tão assoladoras
enfermidades contagiosas: a peste, a cólera, a varíola, todas as variedades de
febres, etc.
A Medicina e a Ciência reconhecem
os efeitos dessas enfermidades; combatem e por vezes cerceiam-lhes os estragos,
mediante remédios, nos quais é latente o influxo benefício e misericordioso de
Deus e dos anjos;
Mas só a fé descortina a
causa invisível de todos esses males, disseminados pelo inimigo de Deus
e dos homens, o pai do mal, o horrível demônio, que está escondido como
malfeitor que é.
É a fonte de que dimanam
todos os males que sofremos.
Instigador de todos os
crimes
Mais do que ninguém, aquele que
deve vergar ao peso de nossa indignação, quando nos vemos a braços com a
perversidade e com as ruins paixões dos homens, é ele tão somente, que os
incita ao pecado.
EIS O QUE ESPERA O HOMEM QUE SEGUE AS SUAS PAIXÕES |
A inveja, a cólera, a
impiedade que mataram Abel, foi ele que as suscitou no coração de Caim; deste
modo fez, primeiro que todos, correr o sangue do homem e espremeu-lhe as
primeiras lágrimas.
Foi, é e será até o fim o
instigador de todos os crimes, de todas as rebeldias, de todas as cruezas, de
todos os erros, de todas as infâmias do gênero humano.
Todo pecado, toda a desordem o tem
por fundamento. Por isso a Igreja, em sua linguagem enérgica e profunda, o
cognomina doutor dos hereges, mestre dos impudicos, pai dos mentirosos, príncipe
do mal.
E sua astúcia, que poucas
vezes falha, consiste em se esconder sempre e em persuadir suas desditosas
vítimas a achar que vêm de Deus os males que sofrem.
Daqui procede a blasfêmia,
extraordinário e abominável mistério, pelo qual o homem infiel, quando a si
próprio faz mal ou quando lho fazem, clama e se irrita contra Deus, ameaça-o e
maldiz o seu santo nome.
O blasfemador que maldiz a Deus
assemelha-se ao indivíduo que, ameaçado por um assassino e defendido por um
amigo, confunde-se um com o outro, e, deixando intacto o assassino,
arremetesse contra o amigo e o matasse.
O demônio é, pois, o autor secreto
e universal do mal, e portanto do sofrimento. Todos e quaisquer males, vêm
direta ou indiretamente dele; assim como todos e quaisquer bens direta ou
indiretamente vêm de Deus.
Nunca
imputemos a Deus o que é obra do demônio…
E assim como Deus distribui a vida
a todas as criaturas pelo ministério de seus anjos fieis, assim também Satanás,
o maior dos anjos rebelados, difunde na criação a rebeldia, a desordem e o mal,
coadjuvado por todos os outros anjos maus, que o acompanharam em sua rebeldia.
Essa luta
invisível, que em nós tão dolorosamente repercute, só no fim do mundo
acabará, porque a fidelidade ou infidelidade dos anjos não lhes pode torcer a
vocação, que consiste em administrar ou governar os elementos da
matéria.
De fato, não é à míngua de
poder ou de bondade que o Senhor tolera o influxo maléfico dos demônios através
dos séculos; sua soberana sabedoria assim o requer, porque não pode a criatura
mudar a seu talante os planos do Criador.
Muitos veem as coisas por um
prisma falso só porque ignoram isso.
Conheci uma senhora, bastante
piedosa e de muitas virtudes até então, que, não tendo podido livrar uma filha
de terrível enfermidade, perdeu, pode-se assim dizer, a fé, acreditou que Deus
era mal e surdo aos seus rogos, deixou de servi-lo e passou o resto da vida em
sombrio desespero. Infeliz! Se ela soubera, ou antes, se tivesse querido
saber!
O mesmo sucedeu a um excelente pai
de família, da Bretanha, cristão prático, que, tendo perdido consecutivamente a
mulher e um filho, tão cegamente pôs à conta de Deus sua desgraça, que, há já
vinte anos, deixou de rezar e de participar de qualquer ato de piedade; nem mais
vai à Igreja.
Durante o cerco de Mans pelos
prussianos, declarava uma senhora que, se estes penetrassem na cidade, nunca
mais rezaria nem iria à Missa. “Se, dizia a infeliz desvairada, eles entrarem,
será sinal evidente de que os Céu nos abandonou. E então para que invocar mais a
Deus?”
Cumpre que estejamos
precatados contra as ilusões, e que nunca imputemos a Deus, extremamente o bom,
o que é obra do demônio e daqueles que o servem.
* * *
Fonte: retirado do livro “Aos
que sofrem, consolações” de Mons. de Ségur.
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