Da prisão e apresentação de Jesus aos
judeus.
Judas entra no
horto e, entregando com um beijo o seu Mestre, caem sobre Jesus aqueles
insolentes ministros e o encadeiam como a um celerado (Jo 18,12). Um Deus preso?
E por quê? E por quem? Por suas próprias criaturas.
Que
dizeis, ó anjos do céu? E vós, ó meu Jesus, por que vos deixais prender? “Ó Rei
dos reis, que há de comum entre vós e as cadeias?” pergunta S.
Bernardo. Que relação existe
entre as cordas dos escravos e dos réus com o Rei e o Santo dos santos?
Mas se os homens se atrevem a vos prender,
vós, que sois onipotente, por que não vos desprendeis e livrais dos tormentos
que esses bárbaros vos preparam?
Ah, compreendo,
não são propriamente essas as cordas que vos prendem: é o amor para
conosco que vos ata e condena à morte. Vê, ó homem, como aqueles cães
maltratam a Jesus, diz S. Boaventura; estes o agarram, aqueles o empurram, uns o
amarram, outros lhe batem.
Contempla então a
Jesus, que como um manso cordeiro se deixa conduzir e sacrificar sem
resistência. E vós, discípulos, que fazeis? Por que não socorreis a fim de
arrancá-lo das mãos dos inimigos?
Pelo menos, por
que não o acompanhais para defender a sua inocência diante dos juízes? Mas, ó
Deus, até os discípulos, ao vê-lo preso e acorrentado, fogem e o
abandonam (Mc 14,50).
Ó meu Jesus
abandonado, quem tomará a vossa defesa, se até os que vos são mais caros vos
abandonam? E ver que essa injúria não teve fim com a vossa paixão!
Quantas almas, depois de se
haverem consagrado à vossa imitação e recebido muitas graças especiais, vos
abandonaram por qualquer paixão de vil interesse, ou de respeito humano, ou
louco prazer. Infeliz de mim, que sou um desses ingratos.
Ó meu Jesus,
perdoai-me, que eu não quero mais deixar-vos. Eu vos amo e prefiro perder a vida
a perder a vossa graça.
Um Deus humilhado por
amor
Conduzido à
presença de Caifás, este o interroga a respeito de seus discípulos e sua
doutrina. Jesus responde que não havia falado em segredo, mas em
público, e que os que o
rodeava bem sabiam o que havia ensinado (Jo 18,20).
A tal resposta um
dos ministros, dizendo-o temerário, dá-lhe uma horrível bofetada,
perguntando-lhe: “É assim que respondes ao pontífice?” (Jo 18,22).
Ó paciência de meu
Senhor! Como é possível que uma resposta tão sensata mereça uma afronta tão
grande na presença de tanta gente e do próprio pontífice que, em vez de
repreender aquele insolente, antes o aplaude com seu silêncio?
Ah, meu Jesus, vós
sofrestes tudo para pagar as afrontas que eu, temerário, vos fiz. Ó meu amor, eu
vos agradeço. Eterno Pai, perdoai-me pelos merecimentos de Jesus. Meu Redentor,
eu vos amo mais do que a mim mesmo.
Em seguida o
iníquo pontífice o interrogou se ele era em verdade o Filho de Deus. Jesus, por
respeito ao nome de Deus, que tinha sido invocado, respondeu que sim. Caifás
rasgou então suas vestes, afirmando ter Jesus blasfemado.
E todos gritaram
que ele era digno de morte! (Mt 26,66). Sim, meu Salvador, sois de fato réu de
morte, pois que vos obrigastes a satisfazer por mim, que sou em
verdade réu de morte eterna.
Visto, porém, que
com a vossa morte me adquiristes a vida, é justo que eu consagre a vós toda a
minha vida. Eu vos amo e nada mais desejo senão amar-vos.
E depois que vós,
o maior de todos os reis, quisestes por meu amor ser desprezado mais do que
todos os homens, eu quero por vosso amor sofrer todas as afrontas que me forem
feitas. Pelos merecimentos de vossos desprezos, dai-me a força para
suportá-los.
Um
rei desprezou o Rei dos reis
Tendo o conselho
dos sacerdotes declarado Jesus Cristo réu de morte, aquela gentalha
pôs-se a maltratá-lo toda a noite com bofetadas, pontapés e
escarros, como a um homem infame (Mt 27,67). E ainda zombaram dele, dizendo:
“Adivinha, ó Cristo, quem foi que te bateu?” (Mt 26,68).
Ah, meu caro
Jesus, eles vos esbofeteiam, vos cospem no rosto e vós vos calais, e como um
cordeiro tudo sofreis por nós, sem vos lamentar (Is 53,7). Mas, se eles não vos
conhecem, eu vos reconheço por meu Deus e Senhor e protesto que sei muito bem
que tudo o que padeceis, padeceis como inocente e só por amor de
mim.
Eu vos agradeço, ó
meu Jesus, e vos amo de todo o meu coração. Tendo despontado o dia, conduzem
Jesus a Pilatos, par que fosse condenado à morte. Pilatos, entretanto, o
declarou inocente; mas, para livrar-se dos judeus que continuavam a vociferar, o
enviou a Herodes.
Este, desejando
presenciar qualquer prodígio por mera curiosidade, interrogou-o sobre muitas
coisas. Jesus, porém, se cala e não lhe dá resposta, visto que ele não a
merecia. Por isso, o rei soberbo o desprezou soberanamente e mandou que
o revestissem com a veste dos loucos, uma túnica branca.
Ó Sabedoria eterna, ó meu
Jesus, essa injúria ainda vos faltava, a de ser tratado como louco. Ó Deus,
também eu vos desprezei no passado como Herodes.
Não me castigueis,
porém, como a Herodes, negando-me a vossa voz. Herodes não vos reconheceu por
quem éreis; eu vos reconheço por meu Deus; Herodes não se arrependeu de vos ter
injuriado, mas eu me arrependo de todo o coração; Herodes não
vos amou, mas eu vos amo sobre todas as coisas.
Não me negueis,
portanto, a voz de vossas inspirações. Dizei-me o que quereis de mim, que eu
quero fazer tudo com a vossa graça. Maria, minha esperança, rogai a Jesus por
mim.
* *
*
Retirado do
livro “Reflexões sobre a
Paixão de Jesus Cristo expostas às almas devotas” de Santo Afonso de
Ligório.
Fonte: http://www.saopiov.org/
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