Esta rua onde “me” moro...
Hoje é um daqueles dias em que me sinto assim… isso mesmo… assim, neste assim que não sei definir e que, de vez em quando me (nos) bate à porta.
Neste momento, neste assim e neste aqui, no assim do aqui do agora em que escrevo este texto, estou a 30.000 pés de altitude, a fazer fé nas palavras do comandante. Destino? Budapeste. Destino final? Desconhecido... Ao certo, ao certo, não sei bem onde vou acabar hoje... mas a verdade é que ninguém sabe, por mais que pense na certeza do contrário.
Hoje, no assim do hoje, é assim... tem de ser assim, porque deixou de ser seguro ser de outra maneira! «Alguém estará à sua espera no aeroporto para o levar ao destino final...» - é que hoje, é assim... hoje como ontem, «o segredo é alma do negócio»; e hoje não é diferente, de tantos outros “hojes” que me veem partir em direção a um qualquer aeroporto... onde alguém me espera. Só que hoje, há cada vez mais medo nas ruas da minha cidade/mundo; mas nunca será o medo que me (nos) fará parar!
E eu penso, penso e pasmo. Se calhar a vida é mesmo assim e o que nos toca a todos sem exceção é isto mesmo... partir sem medo em direção ao medo, em direção a algum lugar, na esperança de que alguém «esteja à nossa espera».
É, é isso, só pode ser isso mesmo. Viver é assim. Passar do aqui que me habita para o ali que habitarei, para voltar a partir e para voltar a chegar.
Um dia, ao chegar, talvez até lá esteja eu, à minha espera e à espera de mim, para finalmente poder ficar... na rua onde “me” moro.
Por enquanto, nos entre(tantos), toca-me ir, hoje, cada hoje, à procura de mim e sair da minha “casa”... e ver... a rua cheia, cheia como eu nunca tinha visto; 1 milhão diz a polícia, 2 milhões dizem os jornais, 3 milhões alvitram outros!
Eu não sei. Não sei contar nem me sei contar, mas podem contar comigo; podem sempre contar comigo! Para quê? Nem eu sei, mas ainda que seja só para ir mais longe, eu vou, mesmo que seja só para chegar ao “tão longe” do outro lado da rua onde “me” moro, onde “me” vivo, onde não estou... eu vou!
Esta é a minha rua/mundo onde “me” moro.
Do outro lado da minha rua, fica a Rue Lambert, mais adiante, a Porte de Pantin, a Place de la Nation, um quarteirão mais abaixo é o recreio da escola de Peshawar, nas traseiras é Bagdad e mais longe, só um pouquinho mais longe fica Tikrit e Mossul, e fica a coragem do medo do meu mundo e o medo da coragem do meu ser... fica o meu medo e a minha raiva, fica o grito por gritar ou talvez não, aqui na minha rua onde se grita por Paris mas onde foram poucos os que gritaram pelos meninos e meninas mortos no recreio da escola em Peshawar. Por uns e por outros eu grito, são todos vizinhos da rua onde “me” moro e de onde “me” saio para chegar, e de onde “me” chego para partir.
É, é isso, só pode ser isso mesmo. Viver é assim. Passar do aqui que me habita para o ali que habitarei, para voltar a partir e para voltar a chegar.
Um dia, ao chegar, talvez até lá esteja eu, à minha espera e à espera de mim, para finalmente poder ficar... na rua onde “me” moro; finalmente em PAZ.
Fr. Fernando Ventura, ofm cap
Publicado em 18.01.2015
Publicado em 18.01.2015
Fonte: Pastoral e Cultura
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